quinta-feira, outubro 30, 2003

Luz X Trevas, a luz se foi, tudo é permitido na calada da noite

Luz X Trevas, a luz se foi, tudo é permitido na calada da noite.

Imaginem se eu deixaria de escrever sobre esse fato histórico na cidade de Florianópolis, nesse momento começamos a levar Heidegger a sério quando fala sobre a nossa total dependência da técnica, no caso da ilha da magia - da energia elétrica. Dois profetas do caos nessa quarta-feira ao tentar consertar um cabo principal que alimenta a parte da ilha da cidade de Florianópolis, acabaram rompendo o tal cabo e com isso deixando uma parte da cidade sem luz, nas trevas ! Quarta-Feira dia 29 de outubro.

Sinaleiras desligadas, as pessoas correndo, tráfego, a universidade federal na quarta-feira já começa a fechar suas portas e expulsar alunos e professores, antes que o caos se instale. Já que estamos sem a proteção divina, a luz que nos protege, sem essa não sabemos conviver, nossa natureza humana, egoísta, negra se manifesta. Sem a luz elétrica nos sinais não respeitamos mais ninguém, sem a luz dos postes a iluminar os olhares alheios, roubamos, matamos, estupramos, enfim, nos sentimos "livres" a medida que estamos fora da luz da censura, da polícia, da moral. Assim a escuridão nos mostra quem somos !

Um simples cabo que localiza-se na ponte que liga o continente à ilha, sem ele voltamos ao estado da animalidade (se é que os animais vivem segundo o princípio egoístico, ou então, considerando que algum dia deixamos de ser bichos). Comida estragando nos supermercados, lojas fechadas, polícia montada andando pela rua, impossibilidade do abastecimento de água, os ônibus têm dificuldade de se locomover, considerando que são abastecidos por bombas eletrônicas e as novas catracas eletrônicas deixaram os ônibus dependentes da recarga das baterias das tais catracas, e já que todos foram aconselhados a comprar cartões eletrônicos para fazer a tal integração, hoje nos vemos presos ao cartão, já que o dinheiro do ônibus foi todo gasto com a carga ou recarga desse maldito cartão!

Esperávamos que esse mundo das trevas que instaurou-se nessa pequena cidade fosse durar por apenas algumas 18 horas ou no máximo 24, mas já vejo os noticiários que os colégios suspendem as aulas de sexta feira também e foi decretado ponto facultativo também sexta, nossa, como viveremos, será que alguém preveu isso? Nostradamus, será? A mãe diná? As estrelas já indicavam algo? Não, puro acaso idiota que nos lembrou que somos humanos, animais e idiotas e que sem um cabinho que nos forneça nossa "luz moral" não sabemos viver entre nós, talvez nem conosco mesmos. Por favor alguém nos vigie, não podemos viver nessa anarquia, essa foi a primeira coisa que eu pensei quando estava andando naquele túnel enorme, que era pra supostamente melhorar o acesso, ou fazer com que as pessoas chegassem com maior rapidez ao sul dessa ilha.

Estava eu no meu ônibus voltando da universidade, quando chegamos a um certo ponto que havia muito trafego, pois as sinaleiras não estavam funcionando e alguém deve ter batido, ou se matado, foi então que desci do ônibus e resolvi caminhar por dentro do túnel enorme, sem luz, sem ventiladores gigantes para tirar o gás carbônico (produzido pelos carros) de dentro dele, tudo bem, um dos túneis foi desativado no momento, pois alguns motoristas começaram a sentir-se mal pelo gás carbônico ingerido e acabaram parando os seus carrinhos dentro do túnel, e tinham que desligar seus motores, a menos que não quisessem morrer dentro dele; com isso um túnel acabou desativado, foi nesse que eu passei, com um certo grupinho, pois as pessoas que saiam do túnel na direção contrária a minha, previniam: "cuidado, estão roubando do outro lado"; "os garotos estão passando a mão, cuidado meninas, esperem pra andar em grupinhos"; eu achava tudo isso divertido e pensava: "como os anarquistas podem ter tanta confiança na natureza boa do ser humano, de onde eles tiraram isso?"; tudo bem, não tenho como provar a má natureza humana, mas sob a lógica do capital, o chamado darwinismo social impera e com ele a idéia do egoísmo radical, nesses momentos se mostra com maior "clareza".

Heidegger já dizia que a técnica determina a vida dos seres humanos e que produzir a técnica sem pensar nos efeitos contrários que ela pode trazer aos seres humanos, pode ser perigoso, essa determinação por parte da técnica da vida dos seres humanos, ele criticava essa maneira de produzir sem pensar as consequências disso na forma inversa, na sua filosofia da técnica. Como ninguém dá bola para os filósofos, que aliás não servem pra nada, os heideggerianos (pessoas que prestam tributo a pessoa de Heidegger, por meio de artigos publicados pelo cnpq ou outras entidades "filantrópicas) devem estar "tinindo", rindo-se atoa, e dizendo: "arrá, eu avisei vocês, mas não adianta, vocês não me ouviram, agora aguentem", até eu estou sorrindo, encontrei uma utilidade para filosofia, Bentham, o filósofo utilitarista, bem dizia: "ao negar o princípio da utilidade você o está sempre afirmando", - desgraçado, mas um dia refutarei-o.

E as empresas, e a produção, meu deus, é o caos, o centro tecnológico parou, "o que será que será?", tudo bem, Florianópolis não é tão importante assim no cenário econômico, talvez o turismo de vez enquando se mostre um pouco expressivo, talvez ter acontecido tal tragédia não seja bom para o marketing "pessoal" da cidade e com isso veremos menos paulistas, cariocas e gaúchos vindo pra cá. Acredito que esse ocorrido proporcionará muita produção de artigos com o título "eu avisei", eu mesmo que não tenho um tema pro meu trabalho de conclusão de curso, já fico instigado a "produzir" algo.

De qualquer forma é estranho ver pela televisão a metade da ponte sem luz, ver de um lado a claridade, a vida acontecendo, e de outro as trevas, a total dependência, o sentimento de atraso, "meu deus, como viviam esses animais a séculos atrás", bom esse seria um belo momento para se refletir a história, as escolas poderiam se aproveitar disso, os marxistas ou marxianos poderiam também fazer algum tipo de crítica a automatização de tudo, da vida principalmente, o mais interessante é ver o fato ocorrendo e pensar que isso se tornará história, poderia ser fonte de tantas reflexões interessantes, que na filosofia se fazem frequentemente, mas não será assim, agradaceremos ao deus eletrônico por nos devolver a luz elétrica e reestabelecer a paz e a ordem automotivas.

Nós somos burros, irracionais, egoístas, monstros, animais que nos movemos pelo instinto, por isso criamos a energia elétrica e a partir dela: robôs, mecanismos eletrônicos que não dependam de nós para funcionar, ou seja, instrumentos que não se movam pelas paixões, sentimentos e sim por meros procedimentos lógicos, algorítimicos, controlando-nos e causando em nós o sentimento de paz e tranquilidade, mostrando para nós como é bom ser uma máquina frente a animalidade dos humanos. Nesse sentindo o nosso amigo Bentham está com total razão quando fala de como o cálculo de prazeres produz a maior felicidade (não vou entrar nisso, é só porque estou lendo isso) - mas ele diz que para uma sociedade ser feliz (ter prazer, realizar seus interesses - ele iguala os conceitos de felicidade, prazer e interesse, entre outros) basta que calculem, tendo em vista a felicidade de todos e assim cada um aceite renunciar a sua felicidade individual e com isso alcançar uma maior felicidade. Podemos fazer uma analogia no caso das trevas florianopolitanas dizendo o seguinte: como queremos ser felizes e vemos que se depender de nós mesmos e de nossas paixões nunca teremos o máximo de felicidade, então aceitamos renunciar a nossa maneira de nos relacionar com as coisas e com as pessoas por forma de sentimentos, visões de mundo diferentes, liberdade e etc; em nome de procedimentos mecânicos que nos igualem e tratem a todos da mesma forma em todas as situações, fazendo assim a nossa sociedade mais feliz, sem respeitar o tal do princípio do serviço social que diz que: "cada caso é um caso"; mas com isso propiciando maior eficiência na busca pela felicidade (não no sentido aristótelico, por favor).


Acho importante pensar sobre tudo isso, remete-me a maneira simples como estão organizadas as coisas, e a formal sutil que pode nos tirar o sentimento de ordem, tranquilidade e paz, deixando-nos com a sensação de caos, anti-progresso, entre muitos outros adjetivos. Isso me leva cada vez mais a desconfiar dessa tal mecanização da vida, ou da maneira como dizemos amém a técnica e comungamos todos da idéia de que sem inglês e informática não se vive na sociedade de hoje, sem questionar-mo-nos como isso nos afeta no dia-a-dia, na nossa maneira de pensar o mundo, as relações, a própria vida; vamos simplesmente vivendo de uma forma que não pensamos nas consequências de um ato (não quero cair no cálculo utilitarista) produz devolta em nós mesmos, talvez não seja inutilidade pensar nessas coisas (refletir com seriedade), talvez para que possamos ter uma vida mais consciente e sejamos um pouco mais críticos quanto a certos ideias propostos seja pela administração, seja pela técnica, seja por modelos econômicos bem-sucedidos, nesses momentos de "escuridão" talvez surja uma "luz" filosófica a inspirar uma possível reflexão que nos leve a uma postura diferente (espero que leiam o post anterior).

quarta-feira, outubro 29, 2003

A filosofia e talvez a educação, relativo a proposta de reforma curricular.

A filosofia e talvez a educação, relativo a proposta de reforma curricular.

Vou começar o texto com os chavões que se ouve nas palestras e entre os alunos do curso de filosofia: Vocês tem que entender que pro curso de matemática, física, química, biologia, e outros é auto-evidente a sua utilidade prática (lógico, quem é que não aplica o logaritimo no seu dia-a-dia, ou então, limite e derivada, classificaçao de polimeros - realmente, estou convencido). Já a filosofia não, ninguém nem sabe o que ela é, então quando os adolescentes deparam-se com ela ao chegar no ensino médio a vêem como algo estranho, uma viagem sem sentido, outros esforçam-se pra encontrar uma utilidade prática(reflexão existencial, algo que dê sentido pra vida, ou para o que fazem, buscar fundamento, auto-ajuda, religião sem deus, etc), outros ainda procuram ver o mercado como está para essa tal filosofia e como são vistos na sociedade os então "filósofos".

Outra dificuldade da filosofia em ter espaço ao discurso - já isso diz respeito a todos os outros cursos que são dados no ensino fundamental e médio; é o seguinte, na universidade os alunos tem um pouco mais de abertura para o discurso de: matemática, física, filosofia, história; porque pressupõe-se que muitos deles vão fazer o curso porque tem um certo interesse, mesmo que mínimo, mas já maior que o total desinteresse dos alunos do ensino fundamental e médio em aprender. No ensino fundamental e médio a educação, o aprender, está mais ligado com a aceitação social (dos colegas, ser bem visto pelos professores, pelos pais) e não propriamente com o ato de se situar no mundo (note-se nos meus discursos o quanto falo disso).

Depois dessa breve introdução de obviedades quero falar sobre essa reforma curricular, a saber, todos os cursos (exclusivamente as licenciaturas) a partir de 2005 devem implementar um novo curriculo que contemple 800 horas de disciplinas pedagógicas. Tendo em vista que atualmente o prática do ensino de filosofia é rídicula, são meia dúzia de aulas ministradas no colégio aplicação (dentro da UFSC) e um relatório a ser entregue. São 5 disciplinas no total de pedagógicas atualmente, já o novo currículo pretende 400 horas de estágio (nossa), contra 72 horas de atualmente. Não quero me ater a dados técnicos, mesmo porque não quero ser chato.

Não tenho problemas com isso, por considerar a pedagogia extremamente necessária e importante para a se construir realmente um saber (notem como sou construtivista - teoricamente), tenho uma certa dificuldade é com a discussão, pois penso que é impossível fazer uma proposta curricular sem ter em vista qual seria o objetivo da educação (no caso da filosofia só no ensino médio), pois dependendo do objetivo é que podemos pensar na formação dos professores. Ex: se o objetivo da educação for situar o aluno secundarista na história das idéias filósoficas visando uma maior compreensão das suas próprias idéias dentro do contexto do todo das idéias, então o objetivo seria o de motivar o aluno nesse ato de se compreender ligado a toda a história, a ver-se na história, a pensar com mais delicadeza em questões como "pensamento próprio", a pensar na relação sociedade, história e indivíduos.

Se o objetivo da escola é discutir questões éticas, que só se fala nisso atualmente, a filosofia nesse sentido não tem muito a contribuir, a não ser questionar as formulaçoes éticas, problematizar as bases, propostas temos a dos pensadores: Kant, Nietzsche, Aristóteles, ..., mas é mais uma fé do que propriamente uma formulação teórica que DEVE ser aceita universalmente tendo em vista a força dos seus argumentos. O que a escola faz é não dar bola pros objetivos, quais os objetivos, qual o modelo de ser humano que se visa ao educar um aluno, o que se está querendo com isso, o que o projeto político pedagógico recomenda.

Cursos como história, geografia, biologia, são ótimos pra situar o aluno na história, bom os cursos como matemática, física, química, esses cursos eram pra ser dados no enfoque histórico, porque é interessante ver os logaritimos, as matrizes, o calculo vetorial, não estou aqui dizendo que isso seja menos ou mais importante (o que se faz é qualificar um saber frente a outro dado a sua utilidade prática), o que estou querendo dizer é que, segundo meu modo de ver, o ensino fundamental e médio tem a obrigação de situar o aluno na história do mundo, seja das idéias e fórmulas matemáticas, físicas, seja das idéias filosóficas, históricas, tudo isso faz com que as crianças e os adolescentes sintam-se pertencidos ao grupos dos seres humanos, brasileiros, latino-americanos, esse sentimento de pertença liga-se diretamente a uma cidadania concreta e madura, liga-se também com um sentimento de valorização do conhecimento, isso eu considero fantástico e isso é o que ME motiva a estudar e a querer aprender.

Eu sinto como é díficil aprender, por exemplo, na filosofia o pensamento contemporâneo, a lógica moderna, isso é tudo muito difícil, sem um contexto histórico bem construido as coisas parecem não ter muito sentido, fica tudo flutuando no mundo das idéias da minha cabeça e acabo nunca construindo realmente um saber, ou seja, pensando no saber como o fruto do conhecimento de um povo, de uma nação, isso tem uma fundamental importância para a construção de uma identidade nacional a partir da escola, e também eu vejo isso como uma tarefa que dá uma motivação as crianças, poxa estar conhecendo a própria história, se situar, entender o contexto que me envolve, imagina que interessante uma educação que privilegie isso. Gostaria de que outros professores (José, por exemplo) pudessem opinar, eu gostaria de discutir isso.